domingo, 1 de maio de 2016

Fé cega

Espero q gostem desse conto. Ñ é d Vampiro mas...

Fé cega
(Por: Humberto Faria de Lima)
Dizia um profeta que se o seguissem em uma jornada longa e árdua, onde muitos pereceriam, mas os sobreviventes seriam recompensados em um céu parasídiaco.
O povo seguiu seu mestre através do deserto de lava.
Duas gerações o seguiram.
Centenas de mortos considerados mártires para os que prosseguiam.
- A jornada esta quase no fim! – anunciou o mestre.
Todos choraram, emocionados.
Eles recolhiam as lágrimas e bebiam, assim como faziam com o suor e a urina de seus corpos.
Bebiam também a água envenenada de enxofre, que fervia no meio das ilhas de magma endurecido.
Quando um pai ou irmão caía durante a jornada, atiravam seu corpo na lava.
Vagavam a sessenta anos no deserto de fogo.
Alguns já tomados de instintos animalescos sangravam e bebiam a vida líquida de seus irmãos, comiam os restos mortais de seus familiares.
Os poucos que assassinaram com esse fim, descobertos, eram atirados ao mar de lava.
O restante do povo se alimentava da terra rica em nutrientes, pois lá não havia animais e tampouco plantas.
Agora chegavam ao fim da jornada, ao pé de uma montanha.
Uma ponte os levaria daquele inferno.
Por três dias e três noites escalaram as encostas, quanto mais próximo do alto menor era a temperatura e mais respirável o ar.
Sentiam-se felizes, pois estavam cada vez mais perto de Deus.
A decepção não tardou a acontecer.
Uma fissura de vinte metros separava a montanha em duas.
Ao fundo ouvia-se o borbulhar da lava.
O único meio de atravessar, uma ponte velha e estreita, desabara havia há tempos.
O povo começou a se lamentar, com gemidos rasgavam a própria roupa e cobriam a cabeça de cinzas.
Os homens arrancavam suas barbas e clamavam aos céus uma solução.
O mestre, o antigo profeta se pôs a gritar exigindo silêncio.
- Que tipo de gente é você? Esmorecem diante da última prova do seu Senhor? Se for assim melhor que morram! Fervam na lava! – gritou ele.
Havia falado mais naquele momento do que nos últimos quarenta anos.
As pessoas olhavam para o mestre.
Teria ele enlouquecido?
- Mas mestre... Como atravessaremos? – perguntou um ancião.
O velho líder o encarou com um brilho no rosto.
Tomando de seu cajado, para espanto de todos, começou a caminhar em direção ao vazio.
Não acreditaram em seus olhos quando ele andou sobre o ar.
Rapidamente estava do outro lado.
- Fé! Quem se apóia cegamente ao braço do senhor não cai! – esbravejou ele.
O povo começou a correr como uma massa compacta, mas caiam como pedras consumidas no mar de lava.
Pararam assustadas, algumas dezenas já haviam se sacrificado em vão.
Hesitava, ninguém queria ser o próximo.
Visivelmente irritado o mestre gritou:
- Será que há um entre vós que crê de verdade?
O silêncio tomou conta deles.
Derrepente um grito.
- Eu! Eu acredito! – berrou um rapaz.
O povo abriu caminho enquanto o jovem quase em transe atravessou o nada.
Podia-se perceber o profeta sorrindo ao abraçá-lo.
Virou-se para a multidão.
- Mais alguém tem fé? – perguntou com satisfação.
A turba se atirou às centenas, caindo como um turbilhão, dissolvendo-se no magma.
Tinham apenas um pensamento em sua mente - Não eram dignos!
Um pequeno grupo ficou na margem da encosta, sem coragem de tentar a travessia. Sem coragem de voltar.
- Vamos meu filho você “é” o escolhido! – disse o mestre com carinho.
Estava feliz e orgulhoso.
Ajoelharam em altar antigo e sumiram num turbilhão de luz.
O pequeno grupo que ficara pra trás clamava em vão.
Deus não os carregaria em sua mão suave.
Ficaram lá ainda por um longo tempo, e logo ouviram um estrondo ensurdecedor.
O local onde o mestre e o rapaz sumiram foi despedaçado e um círculo de luz emergiu, alcançando o céu sem dificuldade.
Os que foram deixados para trás ficaram dias e dias clamando em desespero, até resolveram voltar.
Apenas um chegou vivo após retornar por sessenta anos vagando pelo deserto de lava.
Sua história foi escrita em um pergaminho de uma religião secreta.
O rapaz escolhido por sua fé cega abriu os olhos devagar.
Flutuava em um lugar iluminado onde reinava uma atmosfera agradável.
O mestre a sua frente tocava símbolos que flutuavam no ar.
- Finalmente após quase mil anos terrestres vou poder sair daqui!Com o remendo de diamantes reforçados o casco da neve vai agüentar até chegar a minha galáxia!-disse ele.
O jovem se esforçou para chegar mais perto de seu mestre.
- Quando veremos Deus? - perguntou ele.
Uma risada que não poderia ser de nada humano foi ouvida.
- Você não verá seu Deus primitivo tão cedo, mas sua forte energia psíquica me dará o impulso necessário para sair de seu maldito sistema planetário! – disse o profeta com voz sibilante.
- Você não pode ser o mestre! - Gritou o rapaz subitamente assustado.
Tentou se afastar só para descobrir que estava imobilizado.
A misteriosa figura tirou o capuz, e ao invés da figura barbada e fraternal, um rosto de pesadelo.
Semitransparente, tinha a boca fina e sem lábios, os olhos imensos e negros sem pálpebras pareciam mais com os de um inseto.
- Não!Onde está o mestre? – gritou o jovem.
O ser apertou um símbolo de tantos que flutuavam ao seu redor, e glóbulos de luz começaram a envolver o rapaz.
Seu corpo foi desintegrado.
Primeiro a pele, depois o sangue, a carne, músculos e ossos.
Estranhamente apenas o cérebro ficou exposto.
O alienígena tocou outro comando e a valiosa energia psíquica começou a ser drenada.
Tocou em mais um comando e a nave alcançou o hiperespaço, próxima à velocidade da luz.
Disse para si mesmo com amargura na voz alienígena:
-Seu mestre nunca existiu. Assim como não existe seu Deus. Havia apenas um coletor de dados de uma civilização distante, que por infortúnio caiu no seu planeta.
A nave espacial corta o espaço se afastando cada vez mais de nosso sistema estelar.

“De cada milhar que me procura
Um me segue
De cada milhar que me segue
Um me conhece
De cada milhar que me conhece
Um me alcança
De cada milhar que me alcança
Somente um sentará ao meu lado
No trono do Pai”

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Saturno, o vampiro.

Espero que gostem desse singelo conto q explica a origem d Saturno!!

Saturno, o vampiro.

A tarde na floresta era quente e úmida.
Saturno caçava. Alisou seu colar de dente de onça, pedindo sorte.
Sabia que a hora não era boa, mas aquele fora um dia ruim de caça.
Não era um velho para viver de frutas, mel e bondade dos mais novos.
Precisava voltar com algo.
Pensou em abater um bugio, apesar de preferir uma capivara que era maior e alimentaria a tribo por umas duas luas.
- “Alem de trazer elogios ao caçador.”-pensou sorrindo.
Olhou para o céu alem da copa das árvores que começava a se tingir de tons arroxeados.
Seria o bugio, concluiu ele.
Quando retesou o arco, já com o mais gordo da árvore na mira ouviu um ruído furtivo.
Era um som estranhamente familiar a passos humanos.
Escutou a floresta por alguns momentos.
Quando achou que havia imaginado ouviu novamente, e mais próximo agora.
Virando o rosto, notou um vulto se aproximando em alta velocidade.
Lançou a flecha, atingindo o que pensou ser uma onça, na cabeça.
Um instante depois de ser derrubado viu que seu atacante era um ser humano.
O olho direito havia sumido sob a flecha, cuja ponta saia por detrás da cabeça junto aos cabelos esvoaçantes.
Ele tinha os traços egípcios .
Saturno tentou levantar, mas com a mão esquerda o homem atingiu seu peito com um golpe tão forte que o índio quase desmaiou.
O rosto do caraíba estava totalmente desumano, monstruoso.
Antes que pudesse se defender do estranho ser, foi imobilizado.
Teve o seu pescoço, pescoço mordido e o sangue sugado vorazmente.
Estava roubando sua alma (assim ele acreditava)!
Tudo aconteceu muito rápido.
Ele tirou uma faca de ferro benzido por um jesuíta, pediu ajuda a Tupã seu deus do sol e esfaqueou o ser.
Não pela força do golpe, não pela fé em Tupã, mas o golpe surtiu efeito.
O estranho urrou de dor empurrando o guerreiro e quebrando seu colar de dentes.
A ferida em suas costas escorria sangue e ele se afastou um pouco.
Saturno pôde ver a verdadeira natureza do homem, monstruosa e bestial.
Fingiu estar inconsciente na esperança de que a criatura se fosse, mas ouviu seus passos arrastados voltando.
Um arrepio o assaltou quando sentiu a criatura sobre si.
A mão do monstro tocou seu braço e no instante seguinte não estava mais lá.
Foi decepada pela faca afiada de Saturno.
O horripilante ser gritou de surpresa, segurando o coto do braço.
Antes que pudesse reagir, o corajoso guerreiro decepou sua cabeça.
Com um baque surdo o membro veio ao chão, a agonia estampada na face.
A manhã se aproximava velozmente.
Saturno quase desfalecendo. O pescoço latejava.
Sua visão se nublava pela falta do sangue que perdeu.
O índio sentia que ia morrer e resolveu tomar de volta sua alma.
Agachou aos pés do morto, enfiando a boca no pescoço cortado sugou em longos goles.
Pensou assim ter recuperado sua alma.
Enganou-se, pois acabava de perdê-la para sempre.
A fraqueza tomou conta de seu corpo e ele caiu.
Saturno estava morrendo.
O dia chegou torturando-o com agulhadas invisíveis por todo o corpo, pensou delirantemente ver seu inimigo morto desfazer-se em pó ao contato com a luz do sol.
Saturno fechou os olhos. Estava morto.
Três dias após ser mordido renasceria como vampiro.
Após o que pareceu uma eternidade seus olhos se abriram.
Tudo parecia estranho. Igual, porém diferente.
Apesar da escuridão profunda enxergava como se fosse dia.
Entretanto sentia a proximidade do amanhecer.
Sua pele se arrepiava, com a possibilidade do sol lhe alcançar.
Ouvia o murmúrio das arvores que se perguntava que estranha criatura era aquela.
Mesmo após morto pensava e se movia?
Um lobo-guará uivou pra Jaci, o índio sabia como o animal se sentia. Tentou apanhar a faca, mas esta queimou sua carne.
Agarrou então seu bem mais precioso: o colar.
Um dos dentes de onça ficou no chão mas não havia mais tempo.
Saturno começou a correr com o sol em seu encalço.
Logo atingiu uma velocidade tamanha, que nem uma flecha poderia alcançá-lo. A floresta passava como um borrão em sua frente.
Infelizmente para ele o sol é mais rápido que uma flecha, e quando estava para ser alcançado viu um buraco.
Saltou enfiando meio corpo. Cavando rapidamente, foi penetrando cada vez mais fundo rumo à relaxante escuridão.
Após um sono sem sonhos, acordou. Faminto.
Sentindo a proximidade da noite, Saiu lentamente de seu esconderijo.
Lá fora, o frio da noite o esperava.
Não a noite não estava fria...
Frio estava Saturno. Seu corpo, sua alma.
Correu pela floresta, livre como um espírito da noite.
Quando teve fome, Saciou-a com um animal.
A carne, insípida, mas o sangue... Este tinha um sabor incrível!
Logo o índio o beberia exclusivamente.
O tempo passou, e ele parou de matar indiscriminadamente qualquer animal.
Ceifava a vida dos mais velhos e doentes, que pediam para morrer.
Quando não podiam chegar até ele, clamavam por sua visita à qual ele nunca faltava sempre pronto a lhes aliviar do fardo da vida.
Sua integração com a natureza era total.
Em pouco mais de um século teve poucos contatos com humanos.
Estes encontros viraram relatos e posteriormente lendas, sobre um ser que vivia nas entranhas da selva, montado em um imenso porco do mato.
Foi chamado de Curupira e muitos outros nomes através de sua imortalidade.
Justiceiro da selva, não deixava que os caçadores, índios ou não, escapassem impunes quando matavam apenas por prazer.
Cem anos após ter sido transformado, um fato o tirou do rumo que levava até então.
Cavalgava a noite, percorrendo as matas no lombo de seu porco quando ouviu um ruído.
Eram vozes humanas conversando animadamente.
Resolveu investigar mais de perto.
Como uma sombra moveu-se entre os homens sem que estes o notassem.
Entendia perfeitamente a língua estranha que falavam, mesmo sem nunca a ter escutado antes.
Nada que merece se sua atenção.
Apenas um grupo de holandeses ambiciosos em busca de esmeraldas.
Retirou-se tão silenciosamente como chegou.
Foi quando o inesperado aconteceu.
Um dos homens se levanta e sob o pretexto de urinar se embrenha na floresta.
Era um vampiro também.
Logo começou a seguir Saturno a toda velocidade que podia.
O vampiro índio pressentiu que estava sendo seguido.
Parou de repente enquanto o outro se aproximava.
Os dois se encararam por um bom tempo antes de qualquer um falar.
- QUEM É VOCÊ ?- gritou Saturno.
O homem não respondeu se aproximou alguns passos do índio, com a espada ao alcance das mãos.
Ele era alto e loiro, sua barba, comprida.
- À que clã você pertence?- perguntou ele.
- Suas palavras são estranhas... Não pertenço a ninguém, sou uma criatura da floresta!-Exclamou o índio.
O loiro ponderou por alguns instantes.
- Meu nome é Ivan, o prússio. Meu mestre, Euronimous, sumiu a mais de um século nestas selvas. - disse ele.
- Não sei quem é seu mestre. Eu sou o guardião dessas matas a muitas luas e se quiser posso ajudar a encontrá-lo. - avisou Saturno.
De comum acordo os dois embrenharam-se na mata, sumindo no inferno verde.
Dos bandeirantes que acompanhavam Ivan, apenas dois voltaram vivos. Os outros morreram, consumidos pela febre dos pântanos.
Décadas se passaram, e eles ainda tentavam descobrir algo sobre o paradeiro de Euronimous, mestre do vampiro loiro.
O índio não se sentia muito a vontade com a busca, pois havia percebido que o mestre de Ivan não era outro senão o vampiro que havia assassinado.
Por mais que Saturno os empurrasse para pistas falsas, chegou o dia em que o inevitável aconteceu:
Acharam os restos de Euronimous.
As roupas ainda largadas no solo, e apesar de não haver um cadáver, no local onde o corpo se desintegrou estranhos fungos negros cresciam.
A fivela de ouro e as roupas finas não negavam: era Euronimous.
- Mestre o que aconteceu com o senhor... – murmurou Ivan ajoelhado.
Saturno reconheceu o lugar e também sua faca de ferro que agora não passava de uma mancha de ferrugem.
- Quando descobrir quem fez isso... Ele perderá as tripas. – gritou o prússio.
O silencio do índio era incriminador, mas Ivan nada percebeu devido ao estado de frustração que em que se encontrava.
Após alguns meses o vampiro loiro já havia desistido de achar o culpado.
- O assassino de meu mestre já deve estar morto a essa altura. - Disse ele resignado.
Euronimous carregava em seus pertences um belíssimo punhal, com o qual Saturno foi presenteado.
- Notei como você o olhou quando achamos o resto de meu Senhor! – Sorriu Ivan ante o espanto do vampiro índio.
O índio nada tinha de valor, resolveu então arrancar um dente de onça de seu colar e o deu para seu companheiro loiro.
O prússio ficou surpreso com aquilo.
- Aceite. Isto foi quando matei uma onça com as mãos. - explicou Saturno orgulhoso.
- E ganhou um colar de dentes? – divertiu-se Ivan.
- Não. Ganhei também esta marca de coragem! – retrucou o vampiro índio mostrando uma cicatriz na face.
- Obrigado então! – Disse Ivan respeitosamente, enfiando o dente na algibeira.
Meses depois Saturno perceberia o erro que havia cometido.
Apesar de apreciar a companhia do índio, Ivan resolveu voltar à cidade.
Fazia setenta anos que estava embrenhado na mata atlântica.
Precisava voltar à Europa para se certificar de como estavam seus negócios.
Após conversarem muito, convenceu Saturno a lhe acompanhar.
Mas antes quis ir até o local onde seu mestre morrera uma última vez.
Insistiu em ir sozinho.
Quando chegou lá observou bem o lugar como se quisesse guardar na memória o túmulo verde de seu mestre.
Foi quando notou algo que lhe passara despercebido.
Havia um dente de onça caído nas imediações de onde estivera o corpo.
O dente que ganhara de Saturno, havia sido serrado ao meio.
Pegando o pedaço sujo de limo, encaixou com o seu.
Cada imperfeição combinava terrivelmente.
Dois pedaços de uma única peça.
No começo imaginou que estava vendo coisas, depois tentou achar uma explicação no fato de terem visitado o corpo meses atrás.
Logo seus olhos imortais se tingiram de fúria.
A peça estava envelhecida demais para estar lá à tão pouco tempo.
O alemão viu na faca enferrujada um novo significado.
Quando viu que não conseguia segurar a faca, entendeu como seu mestre havia morrido.
Enrolou a arma em um pedaço de tecido e apressou o passo.
Enquanto voltava para o local marcado de onde partiriam, tecia as mais variadas teorias.
Aquele índio teria uma surpresa mortal.
Ivan tinha certeza que ele nunca chegaria até a cidade.
Saturno notou que seu amigo parecia aborrecido, mas supôs que fosse pela visita ao mestre morto.
Os dois seguiram caminho na escuridão absoluta, quando o vampiro prussiano lhe fez a pergunta que mais temia:
- Como você virou um vampiro?
O índio pensou em mentir, mas temia não ser convincente.
- Bem... Na aldeia nós fazíamos trocas com os produtos dos brancos e certa noite eu fui atacado e... – gaguejou Saturno.
Ivan parou, encarando-o nos olhos.
Os dois estavam a poucos metros de uma cachoeira.
- Você o matou? - perguntou o loiro friamente.
Sua mente queimava de ódio por dentro.
Finalmente o índio percebeu que ele sabia.
Não tinha idéia de há quanto tempo, mas sabia.
O prussiano descobriu a faca, segurando o cabo com um pano.
- Foi com esta faca? – gritou ele.
- Não foi por querer, eu era gente e ele me mordeu! Eu só me defendi! – implorou o vampiro índio.
Ivan parou espantado e ofendido.
Não conseguia aceitar a idéia de que um vampiro milenar, tivesse sido morto por um simples humano.
E pior: não era um caçador, não era nem mesmo um civilizado.
Considerava aquilo impossível.
- Mentiroso! – gritou o loiro possesso.
Atacou Saturno.
Apesar de conseguir se desviar para não ser decapitado, não escapou sem ferimentos.
A Faca cortou sua garganta profundamente.
O índio não conseguiu gritar. O máximo que fez foi empurrar o prussiano.
Ferido, tentou afastar-se para a beira do rio.
Pela segunda vez foi atacado, um golpe que teria sido mortal se por instinto não tivesse desviado a mão de Ivan.
Seria golpeado no coração, mas mesmo com o desvio do puxão a faca penetrou em seu peito.
O índio gritou extremamente ferido.
Tentou se desvencilhar de Ivan e acabou caindo no rio.
A correnteza era forte e Saturno não conseguia sair da água.
Ivan mergulhou para alcançá-lo.
Não pretendia salva-lo, mas sim terminar o que tinha começado.
Só ficou com medo da correnteza arrasta-lo também, pois vampiros em geral ficam fracos em água corrente.
O vampiro loiro correu até a borda de um penhasco, quando viu a queda de setecentos metros ficou satisfeito.
Achava impossível o índio sobreviver.
Ficou observando Saturno lhe estender a mão inutilmente, a faca cravada no peito, cruzou os braços sorriu com maldade e cinismo.
A água puxava o vampiro índio fortemente.
A queda foi violenta e ele quebrou todos os ossos do corpo.
Perdeu os sentidos e quando chegou à superfície foi levado pelo rio.
Ivan esperou qualquer indicio de vida, seguindo o corpo de perto.
Logo se virou deixando Saturno à própria sorte.
Tinha certeza da morte do índio, sua vingança fora feita e melhor ainda, ninguém havia testemunhado.
Ele seguiu rumo a um povoado, pois tinha muito que fazer e um longo caminho a percorrer.
O dia logo chegaria e os animais corriam para a beira do rio.
Satisfariam sua sede e voltariam ao abrigo da mata.
Um grande porco do mato chegou próximo à beira do rio, em um ponto em que ele era mais calmo.
Começou a beber atento a quaisquer ruídos em volta.
A água borbulhou a sua frente e antes que pudesse ter qualquer reação foi imediatamente puxado para o rio.
O grande animal se debateu, e mãos fortes como o aço o agarrou. Dentes vorazes furaram suas carnes.
O animal guinchou fortemente enquanto morria.
Em poucos minutos o animal estava morto.
O lugar voltou a ficar silencioso por algum tempo.
Logo uma figura emergiu da água, seu corpo quebrado em ângulos impossíveis.
Sentia a proximidade do amanhecer, e sabia que teria de se esconder, pois seu corpo se desfaria ao primeiro raio de sol.
Sua dor era imensa, mas ele se obrigava a procurar abrigo.
Com a mão boa arrancou a faca espetada em seu peito.
O grito de dor e fúria encheu a madrugada.
Já próximo à cidade, Ivan teve um pressentimento: o assassino de seu mestre estava vivo.
Sentiu ímpetos de voltar, mas se conteve.
A manhã estava próxima demais. Sabia que era eterno, o destruiria em outra ocasião.
Continuou sua longa caminhada.
Saturno cambaleou até um pântano, seu rosto, deformado pelos quatro lugares em que havia fraturado o maxilar.
Com o crânio afundado e coluna despedaçada, se fosse humano estaria morto.
Apesar de sua alma se encontrar mais ferida que seu corpo, o vampiro índio não aceitava desmoronar.
As lágrimas eram salgadas em seu rosto, deveria sentir muito ódio, mas não.
Estava inundado de tristeza.
A criatura para quem ele jamais levantaria um dedo o atraiçoou.
Ivan era praticamente seu irmão de sangue.
Poderia ter desistido naquele momento.
O sol se aproximava velozmente.
Seria só se deter por alguns segundos e tudo estaria terminado.
Mas não. Seu orgulho indígena nunca aceitaria.
O dia se aproximava velozmente agora e ele começou a afundar no lodo do pântano.
Por três dias e três noites ficou mergulhado na lama.
Os vermes penetravam em seus ferimentos corroendo sua carne morta.
Subitamente em uma lua nova, ele saiu da lama.
Seu corpo úmido escorria estava melhor, não havia sarado completamente, mas estava melhor.
A lua estava encoberta e um nevoeiro se desprendia do chão.
Saturno chapinhava pelos pântanos, buscando alimento. Suas vítimas eram corujas e morcegos.
O máximo que ele conseguia agarrar, desconjuntado como estava.
Noite após noite ele andava seu corpo curando-se lentamente.
Em sua andança percebeu duas coisas: a primeira que estava quase curado e a segunda o lugar para onde se em caminhava.
Ia à cidade.
Precisava encontrar aquele que amava como a um irmão.
Precisava matar Ivan.
Despedaçar seu corpo, destroçar sua alma e lavar sua honra com sangue.
Apesar da tristeza que sentia por dentro.
Por muitos meses andou, até chegar ao seu destino o povoado de São Paulo.
Era o ano do Senhor de 1590.
Foi com hesitação que deu o primeiro passo.
Daquele momento em diante não tinha mais volta, ou era seu sangue ou o de Ivan.
E Saturno não desistia com facilidade.
Apertou com força o cabo do punhal, pois um grupo de salteadores lhe emboscara no mato.
Ele estava faminto.
Sorriu e avançou, observado pela lua que se abria no céu. 
 
Fim

quinta-feira, 28 de abril de 2016

O MAIOR FÃ


Autor: Saturno Vampiro(Humberto Faria de Lima)

Gustavo não conseguia acreditar.
Sara Serena, a grande atriz de teatro e TV, estava bem à sua frente.
Os dois tomavam grandes cálices de vinho tinto.
Apesar de se sentir um pouco mal, pois tinha esposa e filhos, não consegui resistir ao convite da diva.
Gustavo era um simples vendedor de seguros cuja maior paixão era Sara.
Uma paixão que julgava inalcançável.
O destino lhe deu uma mão naquela fria noite de julho.
Após um dia maçante, resolveu comer algo em um pequeno restaurante de aspecto perturbador.
Era um lugar cheio de gente estranha.
- “Devem ser artistas”! - pensou ele.
Colocou sua pastinha de lado e pediu frango.
Todo o movimento cessou, como se tivesse dito algo terrivelmente errado.
O garçom sorriu de modo selvagem aproximando-se mais e mais.
Quando estava próximo o suficiente para tocar Gustavo, alguém lhe agarrou o braço.
- Ele é meu!- avisou uma voz feminina.
Com uma pontada de medo, o garçom fez uma reverência afastando-se em seguida.
- Esse lugar está tão cheio... Posso sentar com você? – quis saber ela.
Gustavo subiu o olhar pelo corpo esguio, checando os seios, e finalmente olhou-a nos olhos.
Tomou um susto fenomenal.
- AIMEUDEUS! SARA SERENA!- Gritou Gustavo.
Um pequeno burburinho tomou conta do pequeno restaurante.
Estranhamente concentravam-se nele.
- Claro! Sente-se! Ai meu Deus!- Disse Gustavo.
Após meia hora de animada conversa, parecia que se conheciam a anos.
Não foi sem uma ponta de culpa, que Gustavo aceitou conhecer o apartamento dela.
Foram em um Astra 2006 blindado cuja marcha tinha um crânio cromado.
Chegaram ao bairro nobre do Iguatemi.
Sara entregou uma nota de cem dólares ao manobrista do prédio.
Os dois subiram trocando longos beijos molhados no elevador.
Era uma cobertura de um edifício que tinha um apartamento por andar, Repleto de obras de arte, e pôsteres de seus filmes e peças.
Beberam um Black Horse e Gustavo estava vidrado nas curvas fatais de belíssima negra.
Os olhos amendoados lhe hipnotizavam assim como a curva dos seios.
Ela usava um corpete e calças de couro bem agarrados, lembrava uma pantera com seu olhar e jeito felino.
Gustavo foi servido com licores exóticos, enquanto seus olhos deleitavam-se com o corpo nu de Sara.
Ela agarrou o rapaz bêbado e excitado.
A atriz mordeu seu pescoço rompendo a carne e as veias.
O grau de prazer era tão grande que Gustavo mal notou que estava morrendo.
Após segura-lo firmemente por alguns segundos, ela o soltou.
O cadáver sorridente caiu no chão com bem pouco sangue.
Os olhos avermelhados de Sara brilhavam de satisfação.
Limpando um filete de sangue que escorria pelo canto de seus lábios, a vampira apertou uma campainha.
Dois grandes filhos da noite apareceram na sala.
Pegaram o cadáver e as roupas.
Jogariam em algum ponto da cidade mais tarde, talvez simulando um assassinato.
- “Até logo, meu fã numero um”! - pensou Sara Serena.
Ela foi se deitar, saboreando o gosto de sangue com álcool que enchia sua boca.

FIM.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Lembranças

Autor: Saturno Vampiro
(Humberto Faria de Lima)
 
Saturno avança pela rua, a fúria queimando sua mente.
Nas mãos carrega a escopeta e na cintura o punhal ainda manchado de sangue. Não gostava de usar armas de fogo, pois as considerava muito barulhentas, mas não tinha escolha. Eles eram muitos.
Um rapaz atirou com um 38, acertando o vampiro no peito.
Saturno cambaleou e mirou com a escopeta; a cabeça estourou como um melão.
O vento jogava com seus cabelos e suas roupas de um lado a outro.
Lembrou-se nesse momento de algo que havia acontecido a pelo menos dois séculos:
No começo do ano de 1800, caminhava pelas florestas em grande parte ainda virgens carregando seu punhal, quando sentiu cheiro de fumaça ao longe.
Apurou a vista na escuridão e enxergou chamas altas a quilômetros de distância.
Caminhou rápido naquela direção e em um quarto de hora chegou a uma aldeia completamente devastada.
Corpos de índios, alguns carbonizados impregnaram os sentidos de Saturno.
Topou com um branco, agonizante, mas vivo ainda.
- O quê aconteceu aqui? – quis saber o vampiro índio.
O português o confundiu com um dos seus e respondeu:
- A índiaiada se revoltou! Mas nós mostramos pra eles quem manda! – riu o branco.
Ele engasgou e começou a cuspir sangue.
Saturno olhou em volta. Homens mulheres e crianças assassinadas sem piedade alguma.
Em todo canto requintes de crueldade.
Mulheres amontoadas, que haviam sido estupradas antes de serem morta a golpes de facão.
O pajé teve a pele arrancada e pela quantidade de sangue o vampiro índio acreditou que ele estava vivo ainda.
O vampiro recolheu um arco e todas as flechas que encontrou. Assim como várias lanças.
Achou uma arma dos brancos e carregou-a consigo, mesmo sem saber usa-la.
Pelas pegadas estavam a uma noite de distância.
Saturno iria vingar seu sangue.
O índio caminhou a noite inteira, seguindo os rastros dos brancos tal e qual uma sombra incansável.
Próximo ao raiar do dia, cavou na terra macia, escondeu as armas nos arbustos e se enterrou passando o dia inteiro sob o chão.
Ouvia dentro de sua mente o grito dos mortos clamando por justiça.
Ao cair da tarde, saiu de seu túmulo.
Quando alcançou o grupo de assassinos, já era madrugada.
Um pequeno exército de cem homens. Bandeirantes, procurando um veio de ouro nas divisas de São Paulo.
Um vigia cochilava de pé, quando teve o pescoço atravessado por uma flecha.
Caiu por terra sufocando em seu próprio sangue.
Outro dos vigias, este mais atento deu o alarme de intruso.
Logo em seguida sua cabeça rolou, cortada pelo punhal de Saturno.
Os homens começaram a se levantar, armando-se às pressas.
O vampiro cobrou explicações do massacre na aldeia.
No escuro ninguém lhe enxergava e ele mudava constantemente de lugar parecendo estar em toda parte.
O capitão dos bandeirantes gritou com arrogância entremeando o português com o tupi-guarani:
- E quem se importa? Eram apenas índios sujos!
Os homens riram confiantes em sua vantagem numérica.
Saturno apareceu à sua vista, o que causou um novo acesso de risos.
Ele segurava a arma ao contrário!
Disparou ferindo-se e levantando nova onda de risos.
Jogou longe a arma e estendeu o arco atravessando um branco com sua flecha.
Eles prepararam as carabinas, enquanto isso Saturno derrubou mais dois.
Trinta e nove homens dispararam suas armas contra o vampiro.
Ele se contorceu e caiu ajoelhado, para em seguida levantar como se não sentisse nada.
Os furos das balas apareciam claramente contra a luz da lua.
Começou a caminhar contidamente, em direção aos inimigos.
Os escravos começaram a correr gritando em ioruba:
- É um demônio!
O vampiro índio os deixou ir, pois sabia que os negros eram inocentes.
Um a um matou todos os brancos.
Apenas cinco escaparam, pois o dia estava próximo.
Foi com relutância que Saturno os deixou, mas se comprometeu a caçá-los logo que a noite se aproximasse.
Matou dois com suas flechadas, descobriu que um havia sido atacado por feras e outro pereceu afogado.
Deixou o chefe dos bandeirantes por último, e após cinco noites atormentando-o finalmente o atacou.
Estava fraco, abatido e alucinado, porém, implorou pela piedade que não tinha com os outros.
Saturno o arrastou pela barba, até achar um formigueiro em especial.
Ali existiam formigas carnívoras. Pendurou-o de ponta cabeça com cipós, e em alguns minutos arrancou toda a sua pele.
O homem urrava coberto de sangue. Saturno voltou na noite seguinte, e observou com satisfação que as formigas cobriam o corpo.
Em alguns dias o bandeirante foi devorado vivo pelos insetos.
Ao cabo de três dias só restavam os ossos.
O vampiro sorriu de satisfação.
Essas lembranças escorreram em segundos e logo ele voltou a se concentrar no presente.
Horas antes não esperava meter-se em tamanha confusão.
Ângela tinha ligado, pedindo que a encontrasse no centro velho de São Paulo.
Mas ele precisava antes ir ao Itaim Paulista buscar certas informações sobre ladrões de banco.
Entrou nas profundezas de uma favela, onde indivíduos o olhavam com desprezo.
Pegou todas as informações que precisava, e também, o sangue do informante.
Quando estava indo embora se surpreendeu com uma explosão.
Homens armados trocavam tiros na favela e diversos inocentes caíam mortos.
Saturno desarmou dois, deixando um apenas desacordado.
O fogo começou a se alastrar, e andando entre os mortos e feridos, estava o vampiro.
Seu ódio era enorme, aos seus pés o corpo de uma criança.
Seu pequenino corpo cravejado de balas.
Carregou o bandido desacordado até uma ponte, abaixo passava a linha do trem.
O Homem despertou, e após ter alguns dedos quebrados disse quem eram e o porquê dos assassinatos.
Tráfico de drogas.
Saturno esperou quarenta minutos pelo trem.
Atirou o bandido para baixo e viu quando foi transformado em uma pasta rodopiante de sangue.
Sabia o que tinha de fazer.
Foi até uma fabrica abandonada, onde estava a quadrilha.
Apesar de a rua estar na mais completa escuridão, Saturno enxergou dois homens claramente.
Esgueiravam-se pelos cantos tentando pega-lo de surpresa.
Deu um certeiro tiro de escopeta e a arma saltou da mão do bandido atingido.
O vampiro rolou pelo chão, examinando a arma que acabara de pegar.
- “Submetralhadora Uzi! Beleza!” - pensou o índio.
Com aquilo acabaria com a gangue.
Pulou o muro de quatro metros, caindo em meio aos ladrões. Abriu fogo contra seus espantados antagonistas.
- Dá-lhe Chuck Norris! – riu o vampiro.
Matou todos que encontrava pela frente.
Encontrou uma caixa cheia de munições de onde tirou algumas granadas.
Após quinze minutos de matança encontrou o líder.
Era um homem que não devia ter mais de trinta anos.
Atirou em Saturno, que avançou inexoravelmente arrancando a arma de suas mãos.
- Não me mata! Eu te pago quanto quiser!- gritou o líder.
O vampiro o encarou sombriamente. E exigiu uma explicação como o fizera tantos séculos antes.
- Mas era só um bando de pobres! - justificou-se o traficante.
Os olhos do vampiro índio tornaram-se vermelhos como o sangue.
Por um instante pensou ter visto o bandeirante na sua frente.
Só tinha uma coisa a fazer.
Arrancou a roupa do chefão do trafico, fazendo uma corda com ela.
Pendurou-o pelos pés e como tanto tempo antes, arrancou toda a pelo do traficante.
Ele gritou como um endemoniado.
Saturno lamentou não haver formigas carnívoras na cidade grande.
Ficou apreciando por alguns minutos o sangue que caía.
- Você tem uma opção... – disse o vampiro.
Vendo que o rosto do homem era uma máscara de dor voltou a repetir:
- Você tem uma opção.
- Uma morte rápida ou demorada... – sugeriu Saturno.
Pôs nas mãos do traficante uma granada, e ele entendeu a mensagem.
O vampiro índio saltou a janela despedaçando-a.
Correu para longe através dos tiros que espocavam ao seu redor e atravessavam sua carne.
Pouquíssimo tempo depois ouviu uma primeira explosão.
Logo em seguida caiu derrubado por uma mais forte: os tonéis de produtos químicos explodiram lançando a antiga fábrica pelos ares.
Pegou seu celular e ligou para Ângela.
Fez sinal para um táxi que só parou ao ver o maço de notas.
Avisou que queria ser levado até o centro.
Saturno avisou para sua garota que se atrasaria.
- Está tudo bem? - perguntou ela.
- Ô! Você não imagina como! - sorriu o vampiro.
Pelo retrovisor, ainda podia ver as chamas que subiam.
 
Fim.